Docente integra CPI que debate uso de animais no ensino

Publicado em: 26/04/2018

Faculdade de Medicina do ABC foi a primeira do País a abolir o uso de animais vivos nas aulas de graduação

 

Dra. Odete Miranda é cardiologista e professora da disciplina de Propedêutica Médica da FMABC

A cardiologista e professora da disciplina de Propedêutica Médica da Faculdade de Medicina do ABC, Dra. Odete Miranda, integra desde o ano passado a banca técnica da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) que investiga o uso de animais vivos em atividades de ensino nas instituições públicas e privadas do Estado. Há 11 anos a docente participou ativamente do processo que tornou a FMABC a primeira faculdade de Medicina do país a abolir o uso de animais nas aulas de graduação, sem qualquer prejuízo ao ensino. A prática passou a ser permitida somente para pesquisas inéditas e com relevância científica.

A CPI de Maus-Tratos Contra Animais foi formada após veto do então governador Geraldo Alckmin, em 2017, ao projeto de lei 706/2012, de autoria do deputado estadual Feliciano Filho (PEN), que pede o fim da utilização de animais vivos como cobaias de ensino nas graduações. O objetivo da comissão é fortalecer a discussão junto a especialistas, ativistas e universidades para derrubar o veto. Entre dezembro e abril, a CPI – presidida por Feliciano Filho e composta por outros oito deputados – ouviu representantes de três importantes universidades estaduais: Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual Paulista (Unesp) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Todas ainda posicionam-se contrárias à adaptação. Caso os deputados derrubem o veto, no entanto, a lei passa a vigorar independentemente da decisão do governador.

No Brasil, assim como em diversos países no mundo, existem inúmeras técnicas de ensino substitutivas à utilização do animal vivo, como bonecos realísticos, simuladores virtuais em 3D, softwares e uso de animais quimicamente preservados (que tiveram morte natural). “Os estudantes treinam diversos procedimentos e habilidades cirúrgicas com a mesma sensação de um organismo vivo. Insistir em antigos métodos, já abolidos nos Estados Unidos e Canadá, por exemplo, é o mesmo que estacionar no quesito ‘educação’. Durante as reuniões da CPI, as três universidades alegaram que há procedimentos para os quais o animal vivo ainda é necessário. No entanto, as mesmas universidades disseram que estão abertas a novos métodos. A Unicamp se propôs, inclusive, a conhecer as técnicas utilizadas na FMABC. Não adianta, porém, estarem apenas dispostas a adotá-las. Caso não as utilizem, poderá haver consequências mais sérias”, explica Dra. Odete, referindo-se à lei federal 9.605/98, que dispõe sobre crimes ambientais.

O Ministério Público, que participa ativamente das reuniões da CPI, está levantando em quais procedimentos essas universidades fazem uso de cobaias. Se para tais técnicas houver método alternativo ou substitutivo, elas poderão ser punidas judicialmente. Em seu artigo 32, a lei estabelece que “é crime a realização de procedimentos dolorosos ou cruéis em animais vivos, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem métodos alternativos”.

Caso a lei seja aprovada, as universidades terão de abolir o uso de cobaias, cuja manutenção é de alto custo e envolve a compra de animais, alojamento e alimentação, além de despesas com funcionários. “Presume-se que o investimento em cobaias seja transferido para a aquisição de métodos mais modernos e éticos. O orçamento deve começar a contemplar esses métodos, pois todos já estão disponíveis no Brasil”, completa a docente da FMABC, que recomenda o site www.animaisnoensino.com.br para consulta atualizada e segura dos métodos de ensino alternativos à utilização dos animais.

Além da Faculdade de Medicina do ABC, outras instituições como Universidade Anhembi Morumbi, Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Universidade Federal do Tocantins e Universidade Federal de Pernambuco já extinguiram o uso de animais vivos nas aulas de graduação.

RECONHECIMENTO

Em 2007, a decisão gerou grande polêmica entre professores e alunos da FMABC, além de questionamentos sobre possíveis prejuízos ao ensino. O tempo, porém, mostrou que a decisão pioneira foi acertada. Nos últimos anos, a instituição acumula conceitos de excelência no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE) e nas avaliações do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp).

Em 2008, a decisão da FMABC rendeu homenagens na Câmara de Vereadores de São Paulo. A instituição recebeu a Medalha Anchieta e o Diploma de Gratidão da Cidade de São Paulo. Já em dezembro de 2015, também na Câmara Municipal de São Paulo, foi a vez das docentes Odete Miranda e Registila Beltrame receberem o “Prêmio Palmas para o Bem”, oferecido pelo Fórum de Proteção e Defesa Animal da Cidade de São Paulo.