Publicado em: 21/11/2013
O Ambulatório de Transtornos da Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC (ABSex-FMABC) completa 10 anos neste 2013 e comemorou a data com evento gratuito em 21 de novembro, que discutiu a interface entre as linguagens jurídica, médica e jornalística na abordagem de crimes sexuais. Entre os casos em debate estiveram o da série de 11 estupros e assassinatos pelo “maníaco do parque” e a exploração do tema pela mídia, que pode ter estimulado a ação de outro criminoso, o “maníaco da praia” – responsável por sete mortes. Outra ocorrência que esteve na pauta foi a do médico Eugênio Chipkevitch, preso em 2002 por abusar sexualmente de pacientes adolescentes e gravar as cenas para assistir posteriormente.
O evento batizado “Mídia, Sexo e Crime” foi conduzido em forma de talk show e contou com quatro especialistas: a jornalista Laura Diniz, o psiquiatra Danilo Baltieri, a psicóloga Margareth dos Reis e o advogado Vicente Cascione.
Segundo o médico psiquiatra, professor da Faculdade de Medicina do ABC e coordenador do Ambulatório de Transtornos da Sexualidade da FMABC, Dr. Danilo Baltieri, os agressores sexuais constituem população bastante heterogênea e, por isso, demandam abordagem individualizada e especializada. “De fato o termo ‘agressor sexual’ refere-se a um construto jurídico-social e não a um construto médico ou psicológico. Isso significa que o agressor é aquele que cometeu um crime sexual assim definido pela lei vigente, e não diretamente a um indivíduo portador de um transtorno mental. No entanto, uma parcela não negligenciável dos agressores sexuais padece de transtornos psiquiátricos específicos. Assim, individualizar a abordagem médica e criminológica torna-se tarefa desejável”, considera o médico.
Dentre os transtornos psiquiátricos mais comumente encontrados na população dos agressores sexuais encontram-se a pedofilia, sadismo sexual, transtornos de personalidade e abuso de álcool e de outras drogas. “Muitas vezes e de forma inadvertida, a mídia refere-se a um agressor sexual de crianças como portador de pedofilia, por exemplo. Contudo, nem todo agressor sexual de crianças porta a pedofilia”, adverte Dr. Danilo Baltieri, que explica: “A pedofilia é um transtorno psiquiátrico de difícil diagnóstico e tratamento. De qualquer forma, nem todo indivíduo que porta este mal comete crimes sexuais. Do mesmo modo, nem todos os agressores sexuais de crianças portam pedofilia. Por vezes, as diferenças de linguagem utilizada pela medicina, mídia e pelo campo jurídico prejudicam o diálogo entre as ditas ciências, causando problemas ao adequado manejo daqueles que, de fato, sofrem de transtornos mentais”.
Para o coordenador do ABSex, a mesma confusão terminológica ocorre com outras doenças médicas que podem ou não estar presentes entre aqueles que cometem crimes sexuais. “Foi nesse campo que procuramos trabalhar durante o talk show ‘Mídia, Sexo e Crime’. O evento buscou promover a discussão amistosa entre profissionais de quatro áreas diferentes, mas afins ao tema – medicina, psicologia, direito e jornalismo –, almejando, assim, azeitar os conceitos, divulgar achados e promover ciência”, encerra Baltieri.
ABSex 10 anos
O Ambulatório de Transtornos da Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC funciona desde 2003 no campus universitário. Vinculado à disciplina de Psiquiatria e Psicologia Médica, atende gratuitamente casos de transtorno da preferência sexual (pedofilia, sadomasoquismo e exibicionismo), disfunções sexuais (impotência, ejaculação precoce, falta de desejo ou orgasmo e dor sexual) e transtornos de identidade (travestismo de duplo papel).
O tratamento é psiquiátrico – com utilização de psicoterapia –, psicoeducacional e à base de medicações. Também há terapia em grupo para orientação e educação sexual. Os pacientes são avaliados individualmente e, de acordo com critérios específicos, são incluídos nos grupos, cuja duração varia entre 16 e 20 semanas.