Publicado em: 15/08/2014
O Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina do ABC comemorou em 7 de agosto o Dia do Pediatra. Apesar da relevância da data, a celebração neste ano não ocorreu em clima festivo. A equipe do setor elegeu como pediatra homenageado o Dr. Ricardo Seiti Assanome, ex-aluno formado pela 38ª turma (2011) e também egresso da Residência Médica em Pediatria, que faleceu em abril deste ano vítima da violência que aflige a sociedade.
Com sede no Anfiteatro Dr. David Uip e na presença dos familiares de Ricardo Assanome, o evento teve início com a mesa redonda “Violência contra crianças e adolescentes”. Em seguida foi realizada a homenagem ao pediatra da FMABC, cujo nome passou a batizar a Sala de Videoconferência – reinaugurada durante a solenidade.
“Conheci o Ricardo quando ele estava no 4º ano de Medicina e acredito que ele me escolheu como uma de suas tutoras. Ao final da aula, ele me procurou para conversar e disse que pensava em cursar Pediatria. Foi quando começou uma relação professor-aluno muito importante”, lembrou emocionada a professora de Pediatria, Dra. Denise de Oliveira Schoeps, que completou: “Este deve ser um momento de reflexão. Não podemos mais perder alunos e jovens, que cuidamos com tanto carinho e a violência leva embora”.
Professora de Saúde Coletiva da FMABC e secretária de Política para Mulheres de Santo André, Silmara Conchão lembrou da relação próxima e de amizade entre estudantes e docentes na faculdade. “Nossos alunos não são números. Nossos alunos têm nome. A relação com os professores é muito próxima e formamos realmente uma família. Hoje é um dia especial, recheado de boas lembranças e de muito amor”, ressaltou.
O professor titular de Cirurgia Pediátrica, Dr. Pedro Muñoz Fernandez, ratificou: “Hoje é um dia para celebrar o que o Ricardo pode nos deixar de positivo. Devemos lembrar desse momento e refletir sobre a mobilização para a paz e para a construção de uma sociedade melhor”.
Já o presidente da Associação dos Docentes da FMABC, Dr. Sergio Baldassin, destacou a importância do evento. “Nenhuma palavra pode amenizar a saudade dos amigos e familiares. O que nós, como instituição de ensino, podemos fazer é isso que está sendo realizado hoje: um debate sobre a violência e uma homenagem que eternizará o nome do Ricardo, em busca de dar algum sentido para o que aconteceu”.
O colega de graduação e companheiro de residência médica em Pediatria, Vinicius, falou sobre o companheirismo e a saudade deixada pelo amigo. “Desde que pisei na faculdade, o Ricardo foi o primeiro que me acolheu. Por 8 anos convivemos de maneira muito próxima. Acredito que o que mais me marcou foi a forma como nos relacionamos com a família e o sorriso dele. Era uma pessoa sempre alegre. É muito fácil falar de coisas boas do Ricardo e essas coisas boas vão ficar”.
Representando a família do homenageado, o primo de Ricardo Assanome, Celso, falou sobre a vocação para a Pediatria. “Nós crescemos juntos, jogávamos bola, empinávamos pipa. Fizemos um trote no Ricardo quando ele entrou na faculdade e vimos ele crescer, evoluir e se formar. Ele fazia a Pediatria de coração. Tinha um dom, que era cuidar de crianças. Era o que ele fazia de melhor. Vai ficar marcado para sempre em nossos corações”.
Após a inauguração da “Sala de Videoconferência Dr. Ricardo Seiti Assanome”, a professora de Pediatria, Dra. Neusa Falbo Wandalsen, agradeceu a presença dos familiares do homenageado. “Queríamos muito fazer essa homenagem e conversamos bastante para decidir como faríamos. Agradecemos a presença da família, pois esse é um evento que organizamos com o coração”.
Contra a violência
Coordenada pela psicóloga e professora do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina do ABC, Dra. Maria Regina Domingues de Azevedo, a mesa redonda “Violência contra crianças e adolescentes” teve entre os debatedores os doutores Eduardo Dias de Souza Ferreira, Maria Aparecida Dix Chehab e Silmara Conchão.
Já no início dos trabalhos, a professora de Pediatria da FMABC, Dra. Maria Aparecida Dix Chehab, apresentou contexto histórico da violência contra crianças desde o Egito, quando um Faraó, com medo de perder seu poder, pedia para a parteira que matasse seus filhos asfixiados ao nascimento e sem que a mãe tivesse conhecimento. A médica narrou casos de violência infantil e falou sobre a criação do primeiro CRAMI – Centro Regional de Atenção aos Maus Tratos na Infância do Brasil e também em Santo André. “As crianças e adolescentes correspondem a um terço da população brasileira, Neste ano pudemos contemplar iniciativas como a Lei da Palmada e a criação da Secretaria de Política para Mulheres de Santo André, que acolhe também os filhos, já que muitas vezes os maus tratos se estendem a eles”, afirmou.
A professora de Saúde Coletiva e secretária de Política para Mulheres de Santo André, Silmara Conchão, expôs histórias de superação de mulheres e crianças que sofreram maus tratos e conseguiram seguir com suas vidas. “É angustiante ver as notícias de violência, seja ela flagrada ou sutil. Acredito que se falarmos de paz, diminuiremos a cultura da violência que estamos vivendo. Todas as minhas pesquisas são qualitativas e não quantitativas, porque preciso ilustrar os números com histórias, boas ou ruins. No final, o que vai restar são nossas histórias”.
Professor de Direitos Humanos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Eduardo Dias de Souza Ferreira completou: “Não adianta criar a criança na base da palmada e depois fazer um discurso de paz, contra a violência, porque ela não viveu isso”. Para o especialista, “aquele que hoje abusa e agride já foi abusado e agredido no passado”.